Imagem: Sophie ThouveninÀs 3.30 da manhã a cidade sentia
o pulsar dos aromas nocturnos.
Às 3.30 da manhã,
a chuva sentia-se nos corpos,
Às 3.30 da manhã,
a cidade ainda bulia,
Às 3.30 da manhã,
as portas dos cafés fechavam-se nas minhas costas,
Às 3.30 da manhã,
os ponteiros andavam,
a fome apertava,
e a chuva continuava a cair.
Às 3.30 da manhã,
abrem-se os subterrâneos da cidade,
locais escondidos de portas fechadas,
onde um toque na campainha nos transporta para outro cenário,
outro filme,
outra dimensão.
As escadas descem-se, onde o olfacto sente os aromas do real "undreground".
Há mesas vazias, outras despidas,
outras cheias,
onde se jogam às cartas,
onde a conversa se eleva e se baixa, ao som de quem entra,
descobrem-se feições,
caras marcadas de vida,
caras marcadas de gente.
Para lá do balcão,
há uma senhora que cozinha:
tripas, massa à lavrador, rojões ou cabrito...
Às 3.30 da manhã,
o vermelho do vinho aquece os corpos da chuva,
o tecto enche-se com o fumo que escapa das bocas,
as conversas embrulham-se no aroma,
e tornam-se mais lentas, mais breves e mais ou menos reais.
As cadeiras vão-se preenchendo a cada passo, onde o subterrâneo se torna o local de destino, das ruas da cidade.
A conversa da minha mesa,
estava quente,
os brindes aqueciam os dedos,
o tinto acalentava a alma,
o tacho queimava as mãos menos resistentes,
o encanto daquele espaço, daquela noite vibrava as horas que voavam no pulso.
No final da conversa retive: a imagem da cara, do espaço, da gente, e a frase que ecoou no barulho da noite:
" Mais vale ir sempre a jogo, sem objectivo de ganhar, ir pelo prazer de se estar"
E com este ir,
e com este estar,
eu quero voltar
às 3.30 da manhã,
ao "underground" de gente, de sabores,
da minha cidade, onde lá fora a chuva continuava a cair.