domingo, 29 de julho de 2007

Se houvesse degraus na terra...

Imagem: Oswaldo Goeldi (1895-1961) Abandono (1930)

Se houvesse degraus na terra e tivesse anéis o céu,
eu subiria os degraus e aos anéis me prenderia.
No céu podia tecer uma nuvem toda negra.
E que nevasse, e chovesse, e houvesse luz nas montanhas,
e à porta do meu amor o ouro se acumulasse.

Beijei uma boca vermelha e a minha boca tingiu-se,
levei um lenço à boca e o lenço fez-se vermelho.
Fui lavá-lo na ribeira e a água tornou-se rubra,
e a fímbria do mar, e o meio do mar,
e vermelhas se volveram as asas da águia
que desceu para beber,
e metade do sol e a lua inteira se tornaram vermelhas.

Maldito seja quem atirou uma maçã para o outro mundo.
Uma maçã, uma mantilha de ouro e uma espada de prata.
Correram os rapazes à procura da espada,
e as raparigas correram à procura da mantilha,
e correram, correram as crianças à procura da maçã.

(Herberto Helder)

5 comentários:

Anónimo disse...

Se houvesse degraus na terra,levaria anos a atingir o seu topo...
A subida seria saboreada, degrau a degrau, olharia tudo à minha volta, e apenas valorizaria o belo!

Em cada degrau faria um balanço dos já subidos e lançaria ao ar as aprendizagens da escalada.


Aguardaria que descessem como se de pétalas de rosa se tratassem e viessem aromatizar o ambiente daqueles que gosto.

Deixo-te com estes "ses" e desejos de um óptimo verão, mesmo a 40 graus....


Beijinhos!

Dalaila disse...

Os degraus na terra existem, quando fazemos caminhadas, quando nos percorremos com a sensação que só subiríamos, para buscar a maçã do outro mundo.

Boas férias!!!!

lupuscanissignatus disse...

Estupendo, este poema.

Degrau a degrau, tinge até o pensamento de vermelho. Vivo.

Dalaila disse...

Benvindo lupussignatus às palavras que se escrevem com vento, iluminadas pela luz, de quem as visita e preenche.

Obrigada

eyeshut disse...

eu não me canso do Herberto Helder. acho que é um amor eterno...*